Introdução
Nos últimos vinte anos a comunidade acadêmica brasileira tem se debruçado no sentido de repensar a área e de produzir referenciais teóricos que contribuam para que avanços aconteçam, sobretudo relacionados ao trato metodológico com os conhecimentos da cultura de movimento, a partir de referenciais críticos. Na atualidade, os professores demonstram preocupação em conhecer novas possibilidades de atuação, rumo a uma prática progressista, comprometida com paradigmas que se diferem dos médico-biológicos, e que tem suporte teórico nas ciências humanas e sociais.
Dentre os estudos desenvolvidos na área, podemos citar, dentre outros, os de Freire (1989), Grupo de Trabalho Pedagógico (1991), Betti (1991), Soares et al. (1992), Kunz (1994), que originaram abordagens metodológicas em educação física. Soares et al. (1992) apresentam a metodologia crítico-superadora que tem como ponto de partida a concepção histórico-crítica. Esta é idealizada por um grupo conhecido na área da educação física como Coletivo de Autores (Valter Bracht, Celi Neuza Zülke Taffarel, Carmem Lúcia Soares, Lino Castellani Filho, Maria Elizabeth Varjal e Micheli Ortega Escobar) que tem como referencial teórico o materialismo histórico-dialético. Desta forma, além de estudarmos as metodologias da área da educação física sentimos necessidade de entender se existe a viabilidade de trabalho em nossa área com a pedagogia histórico-crítica, haja vista que uma das metodologias específicas da nossa área se embasa nesta, além de sua representatividade no setor educacional. Assim, embora a pedagogia histórico-crítica não seja específica da área da educação física apresenta-se como um importante embasamento teórico a ser analisado.
A educação física escolar abrange diversos saberes, dentre os quais encontramos a ginástica, que quando desenvolvida no âmbito escolar, pode permitir a experimentação de possibilidades corporais, promovendo a autonomia motora e a formação humana quando tratada por meio de uma prática educacional que leve o aluno a uma ação crítica e significativa para seu núcleo social. Sua presença na escola pode se dar por meio de diversas manifestações gímnicas, mas neste estudo escolhemos a ginástica geral porque a vemos como uma forma especial de educar. A escolha da ginástica geral como manifestação gímnica para as experiências de ensino aconteceu por acreditarmos na sua importância como conhecimento social e histórico. Segundo Ayoub (2003), rompe com a padronização de movimentos técnicos e sugere a (re)significação dos gestos. Além disso, alguns autores como Ayoub (2003), Barbosa (1999), Bertoline (2005) ressaltam que devido as suas características principais, a ginástica geral, apresenta-se como sendo a ideal para o trabalho com a ginástica na escola. Esta tem como características: o acolhimento dos gestos de diferentes ginásticas, da dança, do teatro, da capoeira, dos elementos circenses e de outros elementos da cultura corporal, com ou sem utilização de materiais. Pode se dar a partir dos saberes inscritos na cultura popular, nos saberes filosóficos, nos saberes artísticos e também nos saberes científicos. Além do mais, deve permitir a participação de todos e o respeito aos limites individuais e coletivos.
Nas aulas de educação física escolar, a escolha do caminho metodológico torna-se crucial para que manifestações gímnicas contribuam positivamente à formação do aluno, e para que não sejam tratadas apenas em sua dimensão técnico-instrumental. A opção por uma metodologia para o trato com a ginástica na escola deu-se a partir da necessidade de buscar caminhos para que a ginástica possa estar se desenvolvendo como um saber da educação física escolar. O objetivo foi analisar como a ginástica geral pode ser desenvolvida na educação física escolar a partir da pedagogia histórico crítica, visando possibilitar a apreensão de conhecimentos gímnicos historicamente produzidos.
Com base no exposto até então, lançamos a seguinte questão norteadora deste estudo: Qual seria a viabilidade do desenvolvimento da ginástica geral como conhecimento nas aulas curriculares de educação física, no ensino fundamental, a partir da pedagogia histórico-crítica? E, como objetivo: analisar, por meio de pesquisa em campo, como a ginástica geral pode ser desenvolvida na educação física escolar a partir da pedagogia histórico crítica.
O estudo realizado tem a pretensão de contribuir com outras investigações voltadas para o trato com as manifestações gímnicas na educação física escolar, possibilitando novas reflexões acerca desta problemática. Procuramos demonstrar que, apesar da complexidade de movimentos desta manifestação, em seu formato desportivizado, é possível trazê-la para as aulas, desde que de maneira estruturada e sempre amparada por referenciais teóricos. Esse é um dos caminhos para o profissional poder entender a diversidade cultural da ginástica, em especial da ginástica geral, bem como a grandiosidade de seu trato na escola. Portanto, entendemos a urgência de pesquisas que foquem o trato pedagógico com a ginástica como saber instituído na educação física escolar.
A ginástica geral e a pedagogia histórico crítica
A pedagogia histórico-crítica tem origem nos estudos de Dermeval Saviani, que procurou melhor delimitar a pedagogia dialética entre as pedagogias críticas. Inspirou-se em Marx, fazendo uso do materialismo-histórico e da compreensão dialética da realidade para propor uma pedagogia que avance para além das teorias da reprodução e possa contribuir no processo de transformação social.
Essa metodologia foi sistematizada/apresentada de forma a ser trabalhada pedagogicamente em aulas, por Gasparin (2002) e possui como suporte epistemológico a Teoria Dialética do Conhecimento que segundo o mesmo autor apresenta para a construção do conhecimento escolar três fases sendo elas: prática, teoria, prática. Assim, "o conhecimento resulta do trabalho humano no processo histórico de transformação do mundo e da sociedade, através da reflexão sobre esse processo" (GASPARIN, 2002: 4).
A pedagogia que deriva da dialética apresenta como primeiro passo identificar a prática social dos sujeitos. Nesse sentido, professor e alunos tomarão consciência sobre essa prática levando-os a buscar um conhecimento teórico acerca desta realidade para que assim possam obter uma reflexão sobre a sua prática cotidiana. O segundo passo consiste em teorizar sobre a prática social buscando um suporte teórico que desvele, explicite, descreva e explique essa realidade, possibilitando assim que se passe para além do senso comum, tendo uma única explicação da realidade e busque os conceitos científicos que permitirão a compreensão crítica da realidade em todas as suas dimensões. O terceiro passo consiste em retornar a prática para transformá-la, pois após utilizar-se de conceitos científicos no processo de teorização, o educando poderá adquirir em seu pensamento uma nova perspectiva da realidade, podendo ter uma posição diferenciada em relação a sua prática (GASPARIN, 2002: 6-8). O mesmo autor entende que
a metodologia dialética do conhecimento perpassa todo o trabalho docente-discente, estruturando e desenvolvendo o processo de construção do conhecimento escolar, tanto no que se refere a nova forma de o professor estudar e preparar os conteúdos e elaborar a executar seu projeto de ensino, como a respectivas ações dos alunos (p.5).
Aliando as três fases do método dialético com a teoria histórico-cultural proposta por Vygotsky têm-se como resultado, de acordo com Gasparin (2002), a representação e tradução para a prática docente e discente da pedagogia histórico-crítica, resultando assim em cinco fases, sendo elas: prática social inicial do conteúdo, problematização, instrumentalização, catarse e prática social final do conteúdo, que serão neste momento evidenciados um a um para que possamos entender como cada um deles deve ser traduzido para a prática escolar.
A prática social inicial do conteúdo de acordo com Saviani (1992) deve ser o ponto de partida do trabalho docente. Este passo consiste em tornar conhecido pelo aluno o conteúdo ou tema a ser estudado/trabalhado pelo professor, ou seja, estabelecer um contato inicial. Em seguida mantém-se um diálogo com os alunos sobre o tema a ser estudado, verificando e mostrando o quanto eles já conhecem sobre o assunto, podendo também evidenciar junto aos educandos que este tema abordado em sala de aula, já está presente na prática social, ou seja, em sua vida cotidiana.
A fase da problematização consiste na transição entre a prática e a teoria, apresentando como finalidade à seleção das principais questões abordadas na prática social, mas que tenham relações ao conteúdo a ser trabalhado, essa fase predispõe também o questionamento do conteúdo escolar relacionando-se com prática social, para que assim possam ser selecionados os problemas que necessitam ser resolvidos no cotidiano dos indivíduos. A partir disso parte-se para a fase da instrumentalização que é o momento em que o conteúdo sistematizado e produzido historicamente é levado ao conhecimento dos alunos, esclarecendo que os conteúdos propostos estão em função das respostas a serem dadas às questões da prática social. Assim, os educandos podem apropriar-se do conhecimento historicamente produzido e sistematizado podendo então, responder aos problemas levantados.
A partir do momento em que os alunos têm acesso a esse saber sistematizado, é chegado o momento em que se solicita do mesmo a participação e manifestação do que por eles foi assimilado, isto constitui o momento de Catarse, que demonstra a nova maneira do aluno de ver o conteúdo e a prática social, sendo ele capaz de entender as questões sociais levantadas no início e trabalhadas nas demais fases, percebendo que não apenas aprendeu um conteúdo, mas algo que tem um significado para a sua vida. Por fim, a prática social final no qual se dá pelo retorno a prática social, mas que agora se modificou por meio da aprendizagem, manifestando uma nova postura e visão do conteúdo estudado em seu cotidiano (GASPARIN, 2002). De acordo com o mesmo autor esses cinco passos devem estar presentes em cada aula, sendo de fundamental importância que os alunos vivam o processo prática-teoria-prática.
Segundo os pressupostos desta metodologia, os saberes e conhecimentos escolares, devem surgir de acordo com as necessidades encontradas na prática social dos educandos, para que futuramente, por meio do estudo dos conceitos científicos e saberes sistematizados, possam compreender, de maneira mais ampla a sociedade na qual estão inseridos, a fim de assumirem uma posição crítica e reflexiva em relação aos saberes escolares e no sentido de aplicá-los em sua prática cotidiana, levando-os a transformar a realidade social em que vivem.
No que diz respeito às teorias de desenvolvimento, Gasparin (2002) afirma que esta pedagogia tem suporte epistemológico na teoria histórico-cultural de Vygotsky. O autor apresenta que esta teoria enfatiza a importância da interação dos indivíduos entre si, como sujeitos sociais, e da relação destes com o todo social no processo de aquisição dos conhecimentos escolares. Nesse sentido, faz-se importante ressaltar como se desenvolve a apreensão dos conceitos científicos na idade escolar, que de acordo com o mesmo autor mostra-se como de grande interesse prático para professores no decorrer do ensino-aprendizagem de seus alunos. Assim, "um dos elementos fundamentais para encaminhar ações didático-pedagógicas coerentes é saber como se constrói o conhecimento na mente da criança" (GASPARIN, 2002: 58).
Em nossas inserções teóricas buscamos aproximações entre a teoria de desenvolvimento proposta por Vygotsky e as características fundamentais da ginástica geral, a fim de entender como esta manifestação gímnica poderia ser tratada a partir da pedagogia escolhida. Por meio dessas relações podemos destacar que a partir do momento que a criança passa a ter contado com a ginástica geral, que se apresenta como uma prática corporal diversificada em suas possibilidades de manifestações, ela pode modificar sua concepção histórica de vida por meio das mediações citadas por Vygotsky (1988), o meio externo colaborando para mudanças internas individuais. Para complementar Teixeira (1996 p. 72) afirma que as atividades coletivas poderão levar o aluno a refletir sobre sua própria ação (prática) e compará-las.
Assim, a ginástica geral pode apresentar-se como uma rica forma de expressão e manifestação corporal aliada a um trabalho desenvolvido e embasado em uma teoria pedagógica crítica e progressista, destacando a possibilidade de criação e participação efetiva do educando por meio da sua experiência de vida. Também poderá contribuir significativamente para o desenvolvimento do aluno, pois partindo do que a criança já sabe sobre este tema, poderá propor novos conhecimentos e desafios, ou seja, sair da zona de desenvolvimento real e incidir na zona de desenvolvimento potencial dos educandos.
Nesse sentido, à medida que a prática da ginástica geral levar os alunos a construírem um espaço em que todos possam participar e vivenciar o universo de conhecimento da ginástica possibilitará uma integração dos mesmos não só com os participantes, mas também com o todo social em que cada um está inserido, pois cada pessoa traz consigo uma experiência diferenciada, levando-os a entrarem em contato com realidades sociais diferenciadas o que contribuirá para o seu desenvolvimento. Essas experiências individuais podem ser socializadas numa aula de ginástica geral por meio da fala, que se apresenta como meio auxiliar no processo de desenvolvimento infantil, assim, a prática da GG possibilita a troca de experiências individuais colaborando para o desenvolvimento da aula e da produção do conhecimento.
A utilização dos materiais tradicionais e não tradicionais, a partir do momento que são utilizados numa aula de GG podem estar servindo de meios auxiliares, estimulando a brincadeira das crianças, nesse sentido, também pode favorecer no desenvolvimento, pois, a partir do que ela já conhece sobre determinado material, podemos propor novos conhecimentos, para que ela possa partir para a zona de desenvolvimento potencial por meio da brincadeira. Para complementar, a criança ao aproximar-se de conhecimentos relacionados à ginástica geral, e considerando o que ela já conhece sobre esta manifestação por meio da sua história de vida, e que compartilhados com o outro no seu ambiente cultural, no caso a escola, institui intervenções com o meio externo, possibilitando mudanças internas na sua história de vida.
Experiências de ensino com a ginástica geral
Após o estudo das metodologias de ensino, a pesquisa em questão volta-se para o trato da ginástica geral na educação física escolar, atentando para as possibilidades de trabalho com este saber a partir de referenciais de abordagem histórico-crítica proposta por Gasparin (2005) e adaptada a Educação Física. Por meio desta abordagem, creditamos que podemos desenvolver um trabalho diferenciado com a ginástica abordando este tema de forma que não se evidencie a modalidade somente em seus moldes competitivos e institucionalizados, podendo levar os alunos a entrar em contato com o conhecimento a partir de suas vivências cotidianas e de sua realidade social, estando diretamente ligado com o processo de construção dos saberes.
As experiências com a ginástica foram desenvolvidas em uma escola da rede pública/estadual na cidade de Maringá-PR-Brasil, no ano de 2006. Doze aulas de ginástica geral (organizadas de forma geminadas), trabalhadas sob a ótica da pedagogia histórico-crítica, foram aplicadas para uma turma de 1ª série do ensino fundamental, conforme espaço cedido no horário regular da educação física pela direção da instituição. Essas aulas, mesmo em número de oito, atenderam ao objetivo proposto para a pesquisa, levando em consideração a realidade da educação física brasileira que, em sua maioria, possui 68h anuais a serem distribuídas entre os conhecimentos da área. Os momentos de intervenção foram registrados a partir de um diário de anotações elaborado ao final de cada aula, destacando os pontos principais ocorridos durante a mesma, bem como as reflexões a respeito dos conhecimentos e métodos tratados na aula, buscando identificar dificuldades e possibilidades na relação com a ginástica geral, bem como seu envolvimento com esse conhecimento gímnico. As observações voltaram-se para experiências gímnicas na pedagogia histórico-crítica e para "comentários" realizados pelos alunos durante as aulas, sobretudo aqueles que retratassem a realidade acerca do conhecimento que tinham sobre ginástica e formas de realizá-la. Os depoimentos extraídos dos relatórios foram aqueles que se relacionam diretamente ao entendimento de ginástica e às experiências obtidas durante os encontros. O quadro 1 apresenta os conteúdos trabalhados e os objetivos dados às aulas.
O primeiro encontro (1ª e 2ª aulas) teve como tema _ Ginástica Geral: características gerais. Durante o processo inicial da aula foram utilizadas questões norteadoras para levar os alunos a refletirem sobre o que já conheciam a respeito da ginástica, para que se pudesse então, identificar a vivência cotidiana dos alunos, pois segundo Gasparin (2002 p. 25) neste momento os alunos "são desafiados a mostrar todo o conhecimento que possuem sobre os itens em questão, fazendo um levantamento sobre a vivência prática, cotidiana dos educandos com relação ao conteúdo a ser ministrado". Por meio delas, foi percebido que no geral a respostas dos alunos dizem respeito às modalidades esportivas já institucionalizadas como a ginástica artística e ginástica rítmica e também que ginástica é qualquer tipo de atividade física, como fazer esportes, alongamento, corrida entre outros. Com relação à ginástica geral foi unânime a resposta de que nunca tinham ouvido falar e nem sabiam o que era.
Após a reflexão realizada, passou-se ao momento de instrumentalização, que se deu por meio da apresentação de vídeos e figuras destacando as características principais da ginástica geral. Nesse momento pode-se observar que os alunos se mostraram interessados pelo assunto, puderam demonstrar e vivenciar o que já conheciam sobre a ginástica geral confrontando suas vivências cotidianas com conhecimentos já produzidos e sistematizados historicamente. Nesse sentido, os conhecimentos individuais foram socializados por toda a turma.
O momento de catarse se deu por meio de discussões e reflexões estabelecidas no qual se percebeu que uma boa parcela dos alunos conseguiu fazer uma relação dos conteúdos abordados com o seu cotidiano, pois demonstraram o que já sabiam fazer de ginástica durante a aula, como relatado: "eu não sabia que cambalhota era ginástica geral"; "eu já sabia fazer estrelinha, mas não sabia que era ginástica geral". O momento da prática social final ocorreu por meio de frases e desenhos que os alunos fizeram sobre o que acharam mais interessante, sobretudo o que vivenciaram neste primeiro encontro.
O segundo encontro (3ª e 4ª aulas) teve como tema _ ginástica geral: confecção e manipulação de materiais não tradicionais da ginástica. O primeiro momento da aula se deu na confecção do malabares pelos alunos, após passamos para o momento da vivência cotidiana dos alunos, em que foi destinado um tempo para que estes pudessem brincar livremente com o malabares explorando e manipulando o material. O momento de instrumentalização ocorreu com a demonstração de algumas possibilidades de manipulação deste material, em seguida, por meio de questões norteadoras, foi pedido para que os alunos demonstrassem formas diferentes das que já tinham sido feitas. Neste momento da aula observou-se o quanto um novo material serve de estímulo para a criatividade dos alunos. Esses traduziram isso dizendo "foi muito legal", "eu nunca tinha brincado com isso e achei legal", "não é difícil", "só é difícil fazer com mais de uma bolinha".
O momento de catarse ocorreu por meio de discussões e reflexões sobre a aula, em que pode ser constatado que a grande maioria dos alunos nunca havia tido contado/manipulação com o malabares. O momento da prática social final desta aula se deu por meio de uma pesquisa em casa e com os pais se existem outros tipos de malabares.
O terceiro encontro (5ª e 6ª aulas) apresentou como tema _ ginástica geral: formas básicas de movimentos e acrobacias de solo. O seu primeiro momento se deu por meio de diálogos com a turma para a identificação da vivência cotidiana dos alunos, em que foram solicitados a refletirem sobre as habilidades propostas para a aula como, formas de andar, correr, saltar, equilibrar e como elas se dão em nossas vidas cotidianas. Após isso se passou ao momento de instrumentalização que nesta aula se deu em forma de estações, nas quais os alunos eram questionados sobre como podiam realizar as tarefas com os materiais propostos (trave de equilíbrio, banco, colchões e mesa baixa). Observou-se que os alunos responderam bem quando solicitado por meio de questões problematizadoras, porém, foram encontradas dificuldades no processo de criação.
O momento de catarse também ocorreu em forma de diálogos retomando as questões propostas no momento inicial da aula. As falas foram: "eu sempre brinquei de pular e andar em cima dos bancos, mas não sabia que isso era ginástica"; "equilibrar é importante pra gente não cair"; "eu brinco de andar no meio fio"; "quase tudo que a gente faz é ginástica". A partir dessas frases, é possível verificar que os alunos conseguiram identificar como essas habilidades podem estar presentes na prática da ginástica geral e esta manifestação em suas vidas cotidianas. Nesse sentido, podemos perceber que os alunos avançaram no sentido de reelaborar seus conceitos cotidianos partindo para os conceitos científicos. A esse respeito Gasparin (2002 p. 128) afirma que é no momento de catarse que o aluno pode manifestar a "conclusão, o resumo, que ele faz do conteúdo aprendido recentemente. É o novo ponto teórico de chegada, a manifestação do novo conceito adquirido". Além do mais, o momento da prática social final se deu por meio de uma exposição por parte dos alunos de figuras e possibilidades que surgiram durante a aula.
O quarto encontro (7ª e 8ª aulas) teve como tema _ ginástica geral: confecção e exploração de materiais não tradicionais da ginástica. O desenvolvimento desta aula procedeu-se em quatro momentos: 1) confecção do material com a ajuda do professor; 2) manipulação do material (vivência cotidiana dos alunos); 3) problematização/instrumentalização; 4) construção e apresentação de uma coreografia com a utilização do material (catarse/prática social final). Novamente pode-se observar que a utilização de materiais que tradicionalmente não fazem parte das aulas de educação física estimulam a participação e a criatividade dos alunos. A esse respeito Ayoub (2003) afirma que a utilização de materiais diversificados, tanto os que são tradicionais da ginástica ou característicos dos esportes, quanto materiais denominados não tradicionais promovem a descoberta de novas possibilidades de ação favorecendo a inventividade, enriquecendo o contexto educativo. De acordo com a mesma autora, "jornais, bexigas, tábuas, revistas, garrafas de plástico, pedaços de isopor, entre tantos outros, podem tornar-se um rico material pedagógico para o desenvolvimento das aulas de ginástica geral na escola" (p. 89-90).
O quinto encontro (9ª e 10ª aulas) teve como tema _a ginástica acrobática no contexto da ginástica geral. O desenvolvimento desta aula se deu em dois momentos: 1) contato inicial com a modalidade de ginástica acrobática (vivência cotidiana dos alunos/prática social inicial); 2) vivenciar e criar movimentos acrobáticos (problematização/instrumentalização). No momento da identificação da prática social inicial pode-se perceber que os alunos não sabiam responder o que era a ginástica acrobática, muitos deles disseram nunca ter ouvido falar nesse nome. No momento de instrumentalização em que foram demonstrados fotos e figuras a respeito desta manifestação gímnica os alunos conseguiram identificar essa prática dizendo que já tinham visto no circo e na televisão. À medida que eram lançadas as questões problematizadoras, os alunos foram se sentindo estimulados, demonstrando algumas formas de movimentos acrobáticos que já faziam parte do seu cotidiano e das brincadeiras infantis como: carregar de cavalinho nas costas, carriolinha, saltar sobre o amigo (pular cela).
Nesta aula foi destacada a importância do trabalho em grupo na ginástica acrobática, pois de acordo com Montenegro et al. (2005) esta modalidade quando trabalhada na escola deve oportunizar aos alunos vivências que estimulem a afetividade, honradez, valorização do sujeito, companheirismo, dentre outros aspectos ligados a formação social dos alunos. No momento de catarse durante os questionamentos finais foi muito interessante o que os alunos disseram no que diz respeito ao trabalho em grupo seguindo algumas falas: "é difícil porque tem gente que fica bagunçando"; "é importante porque se não o amigo cai"; "é legal, mas tem que todos ajudar". Nesta aula o momento da prática social final também se deu em forma de apresentação das possibilidades criadas em grupo para toda a turma no sentido de socializar os conhecimentos produzidos.
O último encontro (11ª e 12ª aulas) se deu com o seguinte tema: ginástica geral: Manipulação de material de grande porte (Pára-quedas). O momento caracterizado como prática social inicial se deu por meio de questionamentos aos alunos se já tinham visto ou vivenciado algum tipo de atividade com esse tipo de material. As respostas foram unânimes dizendo que não. O momento de instrumentalização, diferente das anteriores, não ocorreu na forma de questões problematizadoras, por se tratar de um material de grande porte, os alunos agiram conjuntamente para a sua manipulação, utilizando sempre todos os alunos nas atividades, uma forma em que iriam descobrindo as suas possibilidades. Nesse sentido, as atividades foram propostas por parte do professor e em seguida vivenciadas por todos os alunos ao mesmo tempo. Embora este tenha sido um dos materiais que mais chamou a atenção dos alunos, devido ao seu grande porte e visual que proporciona, muitas dificuldades foram encontradas para se trabalhar com a manipulação do mesmo, pois muitos alunos, não perceberam a importância de se trabalhar em conjunto, e queriam fazer cada um uma coisa ao mesmo tempo.
O momento de catarse desta aula se deu com os diálogos estabelecidos com a turma, com isso pudemos perceber que os alunos gostaram muito de utilizar um material como este na aula, mas as dificuldades de se trabalhar coletivamente foram as que mais atrapalharam. Porém, as discussões parecem ter despertado nos alunos alguma consciência com relação ao trabalho em grupo como evidenciamos nas frases a seguir: "se cada menino for tentar erguer o pára-quedas não vai conseguir"; "é importante fazer junto para ficar bonito"; "se não brincar junto não vai dar certo"; "eu achei o pára-quedas legal, mas não podemos brincar de pára-quedas sozinhos". O momento da prática social final se deu por meio da elaboração de frases e desenhos por parte dos alunos sobre a importância de se trabalhar em grupo com o pára-quedas.
Percebemos que de forma geral os alunos tiveram uma boa participação durante as aulas, ficando evidente que o processo de criação utilizou sempre experiências vivenciadas no cotidiano dos alunos e de suas práticas sociais. No entanto, para buscarmos aproximações com os saberes produzidos na escola, faz-se necessário salientar, que este processo não se deu de maneira simples e sem nenhuma dificuldade. Os relatos dos alunos refletem como se deu a apropriação dos conteúdos e de como esse processo foi importante para que aprendessem criando e resolvendo problemas, mesmo com dificuldades para dialogar no grupo.
Considerações finais
Motivamos-nos na realização desse estudo devido nossa preocupação com a intervenção na educação física, principalmente em garantir o acesso aos conhecimentos da área. Outro aspecto que justifica nosso estudo é que a escola é o espaço clássico da área e, portanto, é na educação física escolar que os conhecimentos podem ser de fato socializados, pelo acesso garantido a todos. Entretanto, na atualidade, autores como Barbosa-Rinaldi (2003), Ayoub (2003) afirmam que, por motivos diversos, a ginástica não tem sido trabalhada na escola. O estudo em questão nos possibilitou entender como a ginástica geral pode ser visualizada na pedagogia histórico-crítica. Além do mais, no decorrer do estudo, as experiências positivas bem como os problemas enfrentados com os alunos da 1ª série do ensino fundamental foram descritos.
Sobre a metodologia apresentada para o desenvolvimento das aulas, no caso, a pedagogia histórico-crítica, percebemos que a mesma pode ser utilizada para o encaminhamento de um trabalho com a ginástica na educação física escolar, e que esta apresenta importantes fatores para que as aulas sejam trabalhadas de uma forma diferenciada das que geralmente observamos nas escolas. Assim, o conhecimento aqui produzido poderá fornecer elementos para os profissionais que estudam e trabalham com a ginástica, bem como para aqueles que se preocupam com as questões metodológicas. A proposta metodológica abordada contribuiu no sentido de levar os alunos a aprender sobre um conhecimento que foi historicamente produzido e sistematizado, mas que puderam vivenciar de uma forma prazerosa e de acordo com suas necessidades e principalmente, com base no que já conheciam sobre o mesmo. Com isso, puderam estar em contato com um conhecimento até então nunca explorado nas aulas de educação física, puderam ampliar seus conhecimentos e identificarem como este pode estar presente em suas ações cotidianas.
Ainda no que diz respeito à metodologia, percebemos que foi interessante trabalhar com um método que leve o aluno a pensar sobre suas ações e conseqüentemente refletir sobre a implicação dos mesmos para a sua vida. No entanto, algumas dificuldades foram encontradas no sentido de criar um ambiente de discussões, talvez porque essa não seja uma prática rotineira durante as aulas de educação física. Encontramos também, algumas dificuldades em visualizar a abordagem de alguns conhecimentos propostos para as aulas baseados efetivamente na pedagogia histórico-crítica. Assim, cabe ressaltar que é necessário que se faça às devidas adaptações na prática pedagógica diária na realidade escolar.
A partir dessas considerações, entendemos que esta metodologia torna-se possível para o encaminhamento das aulas abordando o conhecimento gímnico no ambiente escolar, oferecendo valiosos elementos e que podem ser utilizados para que as aulas de educação física sejam tratadas de forma diferenciada. Neste estudo acreditamos ter elucidado algumas questões metodológicas que contribuirão para possíveis encaminhamentos no sentido de levar esse universo de saberes até a escola de uma maneira significativa, contribuindo efetivamente para que os alunos possam refletir sobre a prática da educação física e da ginástica de maneira diferenciada contribuindo efetivamente para as suas vidas.